Por: Cleide Magalhães
Reportagem exclusiva publicada nos jornais Amazônia e O Liberal, 31/07/2011
Especialista e usuários falam dos efeitos da droga no cérebro
A morte da polêmica cantora britânica Amy Winehouse, 27, que lutava há anos contra as drogas, serve de alerta a todas as pessoas. Como explica o psiquiatra Efraim Teixeira, as drogas são substâncias psicoativas que estimulam o cérebro humano ao ativar uma estrutura chamada sistema de recompensa, responsável pela sensação de prazer.
"Quando realizamos alguma atividade que nos traz prazer, essa área libera uma substância denominada dopamina, importante neurotransmissor no cérebro. Para diversas atividades que realizamos há todo um processo preparatório para que seja estimulado o sistema de recompensa. Mas no caso da droga, ela vai ao cérebro, estimula diretamente o sistema de recompensa e, em poucos segundos, provoca a liberação de dopamina, corrompendo-o totalmente. Então, o cérebro aprende a sentir prazer somente com a droga, que libera dopamina facilmente, pulando todas as etapas. Os pacientes, quando estão em estágio mais grave, param até de se alimentar", afirma.
Isso faz com que o indivíduo perca o prazer com as atividades que antes sentia vontade de fazer, como estar com a família, trabalhar, estudar, namorar. Dependendo da droga, o sistema de recompensa vai ser estimulado mais rápida ou lentamente. Os casos mais graves envolvem o crack e o óxi, que estimulam o sistema de recompensa em poucos segundos.
"Essas drogas têm poder de causar dependência muito mais rápido e a duração do estímulo no cérebro é muito curta. Rapidamente, a pessoa tem que estimular de novo o cérebro para se livrar dos sintomas de abstinência, momento quando passam os efeitos da droga, que também são graves. Aí, tem que acender mais uma pedra da droga, logo em seguida mais outras e assim por diante, se tornando cada vez mais dependente. É possível que em poucas semanas a pessoa fique dependente dessas drogas", alerta.
Na opinião do psiquiatra, o que leva uma pessoa a consumir drogas é, principalmente, a curiosidade na adolescência. A maioria das experiências ocorre quando o jovem está com amigos e em festas. "Há casos em que a pessoa começou a usar logo droga pesada, como a cocaína. Mas, normalmente, inicia com o consumo do álcool e depois experimenta as drogas ilícitas. Embora o álcool seja uma droga legalizada, ainda é um grande vilão, pois acaba levando as pessoas para as outras drogas", considera.
Influência de terceiros forçou uso de maconha, cocaína e crack
O início da adolescência marcou a vida de Waldinei Teixeira, que tem 43 anos e consumiu drogas durante 27. "Desde criança meu pai já me levava para o bar onde ele bebia e este passou a ser um espaço de satisfação para mim. Depois, aos 13 anos, um tio me influenciou a usar cigarro e álcool. Ainda na adolescência sofri influência de outras pessoas e para não me sentir excluído do grupo passei a usar maconha, cocaína, crack, este durante os últimos seis anos".
Devido às drogas, Waldinei afirma que praticamente perdeu a vida social. "Quando consumia, perdia completamente o interesse pelo estudo, emprego e muitas outras coisas, porque a doença se instala, a pessoa vive para usar, se isola da sociedade e não se identifica com ninguém, só com a droga", disse.
Em 2008 ele buscou ajuda no Centro Nova Vida, organização não governamental localizada em Ananindeua, que em duas décadas já atendeu mais de oito mil pessoas. Atualmente, a instituição trabalha na recuperação de 28 dependentes químicos, dos quais a maior parte teve o crack e óxi como drogas consumidas recentemente. "Aqui tive consciência, admiti o problema, resgatei a minha vida e passei a confiar em mim", diz Waldinei.
O presidente do Centro Nova Vida, Luiz Veiga, 69 anos, é um dos exemplos de luta contra as drogas no Estado. Ele foi usuário dos 13 aos 48 anos. "Tenho a consciência de que preciso continuar meu tratamento para o resto da vida. Sei que sou uma pessoa depressiva, por isso tenho que manter sempre minha espiritualidade. O apoio familiar é fundamental e os familiares de nossos pacientes recebem acompanhamento para saber lidar com eles", afirma Veiga.
Quem tem familiares viciados corre mais riscos de repetir padrão
Além da curiosidade, há pessoas que não conseguem administrar problemas ou perdas de forma saudável e acabam procurando as drogas para suprir alguma carência. "Há situações em que a pessoa tem uma perda, alteração de humor, tristeza, problemas familiares, que pode trazer desde a infância, e busca compensar o problema com um estímulo que lhe traga prazer, e as drogas se encaixam bem nisso", afirma Efraim Teixeira.
Quem tem familiares dependentes de drogas conta com maior chance de se tornar um deles. A causa genética é um fator importante, mas não determina se uma pessoa será ou não dependente de drogas. "Quem tem parente que tem dependência química precisa tomar mais cuidado com essas substâncias, entretanto, ser ou não usuário depende de fatores que envolvem a personalidade da pessoa, aparelho psicológico, estrutura familiar e motivação pessoal - a mais importante de todas", esclarece o psiquiatra.
No contexto dos entorpecentes, uma das maiores polêmicas é a discussão a respeito da classificação ou não da maconha como droga. O psiquiatra explica que a maconha é uma droga, causa dependência química e, dentre todas as drogas, é a que mais provoca esquizofrenia, doença mental extremamente grave e crônica que leva a pessoa a ouvir vozes, ter alucinações e sensação de perseguição. "Está comprovado cientificamente que a maconha é uma das drogas que mais leva à esquizofrenia. A maconha, de inocente, não tem nada. Há muito desconhecimento sobre ela".
Consumo precoce, tratamento difícil
Efraim Teixeira alerta que quanto mais precoce é o consumo, mais difícil é o tratamento, porque a dependência torna-se grave. "O tratamento com as drogas é relativo e com crack e óxi é bem mais difícil. Porém, depende de fatores que não envolvem somente a substância em si, mas fatores determinantes mencionados. O apoio familiar é fundamental, mas o indivíduo precisa ter motivação. Se ele não a tiver, há técnicas adequadas para trabalhá-la".
O tratamento mais eficaz deve ser multiprofissional, isto é, envolvendo assistentes sociais, enfermeiros, farmacêuticos, médicos clínicos, psicólogos, nutricionistas, terapeutas ocupacionais, entre outros profissionais da área da saúde. Na equipe, o psiquiatra é quem pode garantir o suporte médico. "Muitas vezes, é preciso fazer psicoterapia para aprender a lidar com situações em que a pessoa não consegue superar e acaba sofrendo com a droga", detalha.
Controle - A dependência química é uma das mais graves doenças mentais crônicas, e para ela ainda não existe cura. Mas, diferente de algumas doenças mentais, é possível superar. "Não existe cura, mas há controle. O dependente químico precisa sempre ter a consciência de que não poderá mais utilizar a substância devido ao risco de voltar a sofrer os sintomas e o quadro que apresentava".
Relação "normal" com o entorpecente não é para qualquer um
Mudanças no comportamento podem ser observadas em vários estágios do consumo de drogas. "Quando a pessoa ainda não está dependente é mais difícil de perceber. No caso do adolescente, porém, ele começa a tirar notas baixas na escola, de uma pessoa dócil passa a ser agressiva e se irrita com qualquer coisa; passa noite na rua sem autorização, fica desobediente", diz Efraim Teixeira. Essas são algumas características que também podem estar relacionadas à depressão. Por isso, ao percebê-la, é importante procurar ajuda de psicólogo ou psiquiatra. As diferenças no aspecto físico, como desnutrição e emagrecimento, são mais presentes nas pessoas que estão em fase mais avançada da dependência de entorpecentes.
Ao consumir drogas, qualquer pessoa corre grande risco de passar a ser dependente, especialmente a partir do momento em que a relação entre indivíduo e substância psicoativa torna-se prejudicial para ele. Quando isso ocorre, é hora de procurar tratamento. "Há pessoas que se envolvem com a droga de forma ‘recreativa’ e levam uma vida ‘normal’, mas há um grande percentual que se torna dependente. É como se a pessoa utilizasse uma roleta russa: não tem como saber se ela vai ou não tornar-se dependente. Ao consumir já existe grande risco", destaca o psiquiatra.
Endereços e telefones úteis
- Centro de Atenção Psicossocial à Saúde do Usuário de Álcool e Outras Drogas (Casa AD), da Secretaria Municipal de Saúde (Sesma). Localizada na avenida Almirante Barroso, 2362, no Marco. Telefone: (91) 3276-0890.
- Centro de Cuidados de Dependentes Químicos, da Secretaria Executiva de Saúde do Estado (Sespa). Localizada na travessa WE 2, 451, conjunto Cohab, gleba I, na Marambaia. Telefones: (91) 3231-4443 e 3231-1481. E-mail: ccdq@sespa.pa.gov.
- Centro Nova Vida, localizado na estrada Santana do Aurá, travessa 10, casa 2, em Ananindeua. Telefone: (91) 3265-1258. E-mail: novavida@amazon.com.br.
Queremos propor que crimes de violência cometidos contra dependentes químicos em casas de recuperação sejam tratados como crimes inafiançáveis e ou hediondos. Os dependentes que buscam socorro para se tratar tem sido vítimas de terroristas disfarçados de terapeutas. É preciso lei para coibir o preconceito e a discriminação também que fazem com que um cidadão brasileiro que muitas vezes paga seus impostos - pois somente uma parte de nós acaba interditado - tenha que se esconder atrás do anonimato com medo de falar que é portado de uma doença. Precisamos de lei que de segurança ao dependentes químicos de se revelarem socialmente como tal. Marcelo da Rocha Presidente ADQR Associação dos dependentes Químicos em Recuperação
ResponderExcluir