sexta-feira, 22 de janeiro de 2010

Zeca Ligiério traz pesquisa afro-ameríndia a Belém

Arte e Cultura

O professor Zeca Ligiéro, da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UFRJ), oferece, na capital paraense, a oficina Estudos da Performance Afro-Ameríndia: criação e documentação digital, voltada para artistas, pesquisadores e demais interessados. A passagem de Ligiéro por Belém deverá também inaugurar parceria artística com o Pará.

O professor Zeca Ligiério, fundador do Núcleo de Estudos das Performances Afro-Ameríndias da Unirio (Nepaa), fez mestrado e doutorado na New York University, sob orientação de Richard Schechner, uma das mais importantes referências nos estudos da performance. Desde 2000, faz parte do Instituto Hemisférico de Performance e Política, um grupo de instituições e artistas, que ajudou a fundar junta a norte-americana Diana Taylor, e atua na realização de pesquisas e encontros em torno da Performance em todo o continente americano.

Nos últimos anos, o Nepaa foi responsável pela realização de encontros dentro e fora do Brasil, reunindo pesquisadores e artistas de vários países da América Latina, como Augusto Boal, Amir Hadad, Paolo Vignolo, e Regina Polo Müller, dentre outros.

A oficina Estudos da Performance Afro-Ameríndia: criação e documentação digital deriva de uma prática de investigação de campo de aproximadamente quinze anos. Documentos audiovisuais, textos e experiências guardam o registro de práticas performativas, que popularmente conhecemos como folguedos, danças, manifestações e festas populares. “A necessidade de documentar criou a coleção de variado material, com destaque especial à questão do corpo”, explica Ligiéro. “A partir daí, conceituamos as ‘práticas performativas’, traçando o que chamo de ‘motrizes culturais’, ou seja, as dinâmicas em que se processam essas tradições, a partir da ‘restauração’ de determinados comportamentos ancestrais, de raiz étnica, um conceito do professor Schechner a partir do qual identificamos as origens afro-brasileiras ou ameríndias”, conta.

Segundo Ligiéro, o objetivo da oficina não é chegar a um trabalho simplesmente antropológico ou etnográfico, mas a um uso artístico do material coletado em experiências de campo em novas experimentações performáticas.

A oficina se divide em duas etapas: a primeira deverá promover um mergulho nos estudos da performance, abrindo espaço para a reflexão sobre as possibilidades de criação artística em performances solo, de grupo, danças, ou até mesmo, num espetáculo de teatro. A segunda etapa será a pesquisa de campo propriamente dita, sempre com assistência do professor. Nesta o objetivo será iniciar os processos de criação de cada participante.

No final da oficina, espera-se ter um registro documentado e editado em vídeo, além da apresentação das criações individuais ou coletivas para o público. “O objetivo final é chegarmos próximo da formação de um artista-pesquisador, estou muito interessado nessa formação em que o artista possa desenvolver seu trabalho inserido numa investigação de cunho social, antropológico, a partir de suas tradições”, afirma Ligiéro.

Segundo Zeca, o artista-pesquisador é aquele que se debruça nas suas origens e no diálogo crítico com as tradições. “Se você não sabe para onde vai, pergunte de onde você veio”, afirma o professor, citando um ditado africano.

A Performance no Pará

A ligação do Nepaa com o Pará tem raízes e destinos curiosos. Desde 2007, a artista paraense Michele Campos, formada pela Escola de Teatro e Dança da UFPA, reside no Rio de Janeiro para desenvolver sua pesquisa de mestrado sob a batuta acadêmica de Zeca Ligiéro. A investigação sobre o diretor paraense Luiz Otávio Barata deverá ser apresentada no segundo semestre de 2010 e conta com uma rede colaborativa que envolve artistas e pesquisadores de Belém e até da Europa conectados por meio do blog da pesquisa (palhacodedeus.wordpress.com). A partir desse ano, mais um paraense realizará pesquisa acadêmica no Nepaa. Será Miguel Santa Brígida, que começa pós-doutorado na Unirio esse semestre.

Quanto à oficina em Belém, Zeca Ligiéro afirma que é fruto de um interesse sobre manifestações como a marujada, o carimbó, e o lundu, praticamente extinto no restante do Brasil. “O Pará é um Estado em que essas manifestações aparecem de forma bastante intensa; aqui a confluência do afro e do ameríndio me parece muito forte”, afirma.

Há algum tempo que a ETDUFPa, por meio de Karine Jansen, vinha convidando Ligiéro para vir a Belém, mas a oportunidade se materializou só agora graças a aprovação de um projeto do Nepaa no programa Residência Artística da Funarte, que trouxe o pesquisador para a cidade de Soure, na ilha do Marajó. Juntando as forças, a ETDUFPa angariou apoio do Instituto de Artes do Pará (IAP) para viabilizar de vez o curso em Belém.

A ideia é que esse curso resulte na instauração de uma base do Nepaa no Pará. “Ao longo dos anos, juntamos um acervo de DVDs, CDs, textos, livros, peças, e ao mesmo tempo uma demanda crescente por material”, explica Zeca. Criar outros pólos de estudo das performances fora do Rio de Janeiro é uma forma de compartilhar e realimentar esse acervo. Em Bogotá, na Colômbia, já existe uma parceria formada, e Belém deverá ser a próxima base.

Serviço - Oficina “Estudos da Performance Afro-Ameríndia: criação e documentação digital” acontece na ETDUFPa, de 25 a 30 de janeiro, pela manhã. A ETDUFPa fica na travessa Dom Romualdo de Seixas , 820, esquina com a rua Jerônimo Pimentel. As inscrições são gratuitas, mas as vagas limitadas. Mais informações: (91) 3212-5050.

Texto: Marcello Gabbay, músico e doutorando em Comunicação e Cultura pela UFRJ.

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